Classe, categoria e identidade. Só a união faz a força.
Fábio Melo*
É muito comum as divisões internas dentro da classe trabalhadora. Essas divisões são criadas, manipuladas e difundidas justamente para que não haja o mínimo de organização por demandas em comum por parte de trabalhadoras e trabalhadores.
Vamos explicar alguns aspectos, no sentido de unir trabalhadores, formais, informais e desempregados para uma atuação eficiente na sociedade e na política.
Classe trabalhadora é algo amplo. Pode ser entendido, para fins didáticos, todos aqueles indivíduos que vivem com salário resultado de seu trabalho. Ou seja, não importa o quanto você ganha, se você sobrevive graças a um salário, você é da classe trabalhadora.
Se você não vive de salários, ganha lucros ou rendas a partir de alguma propriedade; se é dono de alguma fábrica, fazenda, mina ou de uma grande empresa comercial, ou consegue viver apenas de aplicações do mercado financeiro (sendo acionista de grandes empresas) nestes casos você não é trabalhador. É um capitalista.
Porém, dentro da classe trabalhadora existem várias divisões chamadas de categorias. Exemplos de categorias: médicos, professores, funcionários públicos, metalúrgicos, entregadores, frentistas, caixas de supermercado etc. Como a sociedade é muito ampla e complexa, cada categoria tem anseios particulares. Por exemplo, a categoria dos professores públicos não possui as mesmas demandas dos professores particulares. Funcionários entregadores de aplicativos não possuem as mesmas reivindicações dos trabalhadores dos correios. Sendo assim, cada categoria tem suas lutas particulares, o que não excluem lutas em comum de toda classe trabalhadora. Por exemplo, trabalhadores de todas categorias devem lutar em comum por salários dignos, por pleno emprego, por 6 horas de trabalho diárias e previdência. Desempregados também precisam se juntar a essas lutas, afinal, estão buscando empregos decentes.
Ocorre, porém, que o sistema capitalista (que é impessoal mas nem por isso deixa de ser manipulado por grandes capitalistas, riquíssimos) usa de alguns mecanismos para dividir a classe trabalhadora, que já tem suas divisões em categorias. A mais recente e perversa dessas divisões é a ilusão criada de que os trabalhadores não pertencem a classe trabalhadora, pertencem a outra "classe" chamada de "empreendedor". O discurso do empreendedorismo esvazia a identidade de classe, dando a impressão que o trabalhador "empreendedor" está "acima" da classe a qual pertence: "por que lutar por pleno emprego se sou empreendedor e não trabalhador?" - é o que querem que pensem. Os empreendedores precisam ter a clareza de que são trabalhadores.
Além da falta de identidade embutida no discurso do empreendedorismo, há ainda a precarização do trabalho, principalmente dentro das empresas de aplicativos. Recentemente, no dia 1 de julho, entregadores de aplicativo realizaram uma grande paralisação para reivindicar direitos básicos, como melhores salários e proteção para enfrentar o coronavírus. É um movimento importante, sem dúvida. Mas a categoria dos entregadores de aplicativos muitas vezes é um "cruzamento" de outras categorias: alguém trabalha pro aplicativo para complementar a sua renda. Essa falta de identidade, ou imprecisão da identidade de classe, joga contra a categoria e a favor do capital.
É preciso resgatar a identidade de classe dos trabalhadores e trabalhadoras. Desempregados e informais também precisam se juntar as lutas da classe, que são as dessas categorias também. Os sindicatos e movimentos de trabalhadores precisa abraçar os desempregados, caso eles se identifiquem com alguma categoria. Se não houver o sentimento de que só a coletividade e causas comuns transformam, apesar da categorização da classe trabalhadora, a tendência é que o trabalho seja sempre "nivelado por baixo", e, desta forma, apresentam-se condições de trabalho cada vez mais precarizadas - e as pessoas terão que aceitar trabalhar nessas condições, ou não terão o mínimo para sobreviver.
Só a clareza de qual classe você pertence faz a diferença para conquistar e ampliar direitos. E também para perceber que direitos não são privilégios e todos precisam para ter qualidade de vida e dignidade.
*Historiador. Trabalhismo21 - Porto Alegre
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