Questões relevantes
Nelson Aspesi*
Na democracia temos duas posturas opostas: 1 a confiança em que a maioria do povo, em ultima análise, é boa, justa e racional na hora de tomar uma decisão; 2 a convicção de que o povo em geral é tão corrupto que não se pode confiar o poder a indivíduos sem mantê-los sob constante vigilância. Não devemos apenas ver estas duas posturas como opostas, devemos entender essa combinação inigualável de confiança e desconfiança como o amago da visão democrática. A democracia se torna então nosso último fetiche que nos protege da própria democracia violenta que as complexas regras democráticas tentam manter sob controle. A essa opressão não basta compreender e ser seu filosofo, também é necessário destruí-la.
Como coloca o filosofo contemporâneo Byung-Chul Han, passamos da sociedade disciplinar de Foucault para a sociedade de desempenho do século XXI, segundo Byung:
"O neoliberalismo é um sistema muito eficaz, e de facto inteligente, de explorar a liberdade. Explora-se tudo o que pertence a práticas e formas de liberdade, como a emoção, o jogo e a comunicação. Explorar alguém contra a sua vontade não é eficaz. Na exploração de outrem, o produto final é parco. Só a exploração da liberdade gera rendimento. Assim para se reproduzir, o capital explora a liberdade do indivíduo: Na livre concorrência não são os indivíduos que se afirmam como livres, mas o que se afirmar como livre é o capital.”
A sociedade de desempenho nos torna dependentes ao invés de submissos, seduz ao invés de proibir. Com a mercantilização de significações e emoções, não é o valor de uso, mas o valor emotivo ou o tão falado valor de culto que constituem a economia de consumo. Vemos então o capitalismo de emoções se servindo da liberdade.
Temos razão em nos revoltar. Como diria Mao: “Rejeitem suas ilusões, preparem-se para a luta”.
A realidade só poderá oferecer consolação quando transformada.
E aqui eu evoco Marx: a impotência do povo sempre é sua divisão interior, sua separação de si mesmo. Falta ainda a audácia revolucionaria que arremessa ao adversário a frase provocadora: Não sou nada e serei tudo.
“Não somos nada, sejamos tudo” é a própria definição da revolução: um inexistente apoia seu ser-múltiplo para declarar que ele vai existir absolutamente.
A obra de Marx chegou a sua posteridade com uma tarefa impossível: continuar o que foi acabado.
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